Lembranças eternas

Envelhecendo no passado, levei o futuro como refém e o presente tratei como um ninguém. Sem perceber, forcei o relógio a voltar no tempo, ou melhor, segurei os ponteiros e o tempo parou. Mas a vida não espera, e o tempo (não o meu, mas o real), este sim se distanciou…
Me agarrei nas vigas que restavam dos tremores do meu coração, e ao invés de erguer novamente os muros, passei a viver em meio aos escombros e me escondendo na completa escuridão.

Apesar das inúmeras tentativas, não tive forças para me reerguer, pelo contrário, o mundo inteiro desmoronou ao meu redor, ao ponto de não haver mais chão para despencar, e foi quando imaginando o meu completo fim, entendi, que somente despencando ao infinito é que seria capaz de voar!

Agora, prossigo com o objetivo de rejuvenescer o tempo perdido, libertar o futuro das algemas da ansiedade e principalmente amar o presente como nunca amei ninguém, pois os tremores que outrora desolaram-me, perderam as forças e estão calmos, mas a verdade é que tanto a paz quanto o caos jamais deixarão de coexistir dentro do meu coração.

E quem sabe eu comece a viver, não lançado no futuro ou esquecido no passado, mas vivendo verdadeiramente no agora — Mesmo que para isso se torne refém dos anseios reprimidos, que juntos lutarão incansavelmente pela liberdade que lhes tomei — Se assim for necessário, pois bem, que até os meus últimos dias este seja o meu eterno fardo, pois na dor me orgulharei por completo, de quem na mais profunda ilusão não me tornei.

Diego Rodrigues Silva Aguiar
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Novo normal, tentativa e caos

Durante o tempo em que aguardo no ponto de ônibus, reflito sobre os noticiários. Confesso que um certo medo me consome, visto que o suposto vírus propaga mais rápido que o meu próprio medo. Ao mesmo tempo, amenizo a preocupação, sejamos otimistas, um continente nos separa da propagação… Meu ônibus se aproxima, e no mesmo instante em que subo os degraus rumo ao terminal, nem imagino a subida nos indicadores: um, sete, vinte, cinquenta contaminados, as fronteiras não foram suficientes, pois o comércio carimbou o passaporte para um vírus internacional!
De risadas entretidas a olhares preocupados, os sorrisos mudaram entre o trajeto do primeiro ponto. Alguns passageiros desceram, enquanto outros subiram, eu diria que com aspectos diferentes, um tanto peculiares. Máscaras tornaram-se obrigatórias, álcool em gel uma arma na mão, porém, o caos era quem realmente estava armado, pois novamente surpresa nos indicadores, agora com estudos e previsões de milhões de mortes, o medo tornou-se generalizado, a contaminação um surto mundial…
Muitas coisas aconteceram nos próximos pontos, decretos flexionavam a aglomeração, apesar de no transporte ser a principal, eis as ironias do capitalismo, ironias… Logo, estopins de contradições no novo normal: leitos superlotados, enquanto gozavam com a verba da saúde, governo no leite condensado, já a população sem leitos e nem covas, só sorriso cabisbaixo, sendo que além do lamento pelos mortos, os que lutavam pela vida eram golpeados, com ansiedades, crises e distúrbios psicológicos.
As luzes no ônibus falhavam, ao passo em que um rasgo na sanfona refletia o brilho da noite, era assustador, mas não tinha para onde fugir, era apaixonado por não morrer de fome. O toque de recolher era às dez, mas como chegar às dez se só saía do ônibus às onze? A idealização de isolamento era perfeita, claro, para quem tinha condição financeira, já o isolamento da população era dentro do busão, na perfeita companhia daquele de quem tanto fugia…
Inevitavelmente o mundo questionou a brevidade da vida, e por não prever o amanhã, o hoje tornou-se motivo de relaxamento. Rapidamente as medidas de prevenção foram colocadas em segundo plano, e o novo plano tornou-se aproveitar o restante da vida. Quando me dei conta, o senso comum compartilhava e comentava bate e volta de viagens, a última parada ainda era o terminal, mas como assim no litoral? Novamente estopins de contradições: Isolamento social; a social até com desconhecidos, álcool em gel; nova bebida alcoólica nos barzinhos, máscaras; um protótipo alternativo de sunga, média de mortes; aquela média com os amigos, e o novo normal uma manchete diária no jornal! O que mais poderá acontecer? Sabe lá quem…

Diego Rodrigues Silva Aguiar
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